domingo, 17 de março de 2013

Todo lugar é um lugar temporário





São infindos dedos
Abraçando chaves gélidas
Guardando
Em gavetas
Promessas e gengivas
Remelas e sonhos
O que eu faria com o cabelo das mulheres que seguram estas chaves?
Elas me colocaram em seus quartos
Mas não me trancaram com seus olhos
Com suas coxas disformes
Com seus ventres mornos
Tampouco com as chaves frias
E agora eu estou muito longe
A milhas do desenho que fiz para mim
Continentes distante do meu sorriso displicente
Simplório
Um traço em arco
Pela arrogância de não saber como sorrir
Pela simplicidade de não saber como desenhar
E se por um momento eu pensar em todas as portas que eu atravessei sem olhar para trás
Para todos os rostos desfragmentados sem esperança
Para todas lágrimas sinceras derramadas
Lágrimas puras
Lágrimas de dono em velório de cão
Eu não queria nada
Por isso tudo ficou para trás
Nada
Talvez apenas uma chave mestra
Invadir teu sono profano
Olhar para as paredes mal pintadas do teu quarto triste
Fazer um pedido enrustido em desejo
Arrumar a coberta já arrumada no teu corpo
Passos leves
Vagaroso ao girar a chave
Preocupado com o som do trinco
Preocupado com o som do peito
Fora do teu quarto
Caminhando
Correndo
Milhas
Um continente
Dois continentes
Longe o suficiente para erguer a cabeça
Nem triste ou feliz
Eu sei
As chaves sempre ficaram nos meus bolsos
Apenas meus palácios de vinte metros quadrados me deixaram
Todo lugar
É um lugar temporário

Tiago André Vargas


Fotografia de Zeynep Ozdemir.

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