Pistolas carregadas
de gargalhadas desconfortáveis.
Piscar com tinta
negra me faz escrever posse no
contrato que é só batom com cheiro ruim, papel manteiga e focinho de bezerro.
Alguém vai sorrir ao ler isso. Eu não.
A noite caiu, menina
da cidade fria em fotos coloridas se assusta ao me ver como uma puta mulher.
Menina condicionada
que passa condicionador sempre se assusta com gente puta. Não pela puteza e sim
pela liberteza: Aquela liberdade na incerteza que por desespero ou organicidade
faz o corpo gritar e a mente calar. Sábio seria o contrário, mas sem celibato.
AQUI é só status assustatus.
Assustam-se com tudo. E assustadas como ficam feias essas provincianas de olhos
claros e cabeça de porco. Parecem bolo de três semanas com suas coxas brancas e
o coração de requeijão jogando forca, sozinho, quem vai perder?
Engraçado é que têm
fila para comê-las.
Hóstias perfeitas.
Tem fila pra tudo,
até para morrer.
Por isso estou só, como
uma puta mulher, vendida e bem comida pelos meus próprios sonhos. Pianos
esmagaram meu sexo na música que eu escolhi.
Blá blá blá. Disse o
bezerro, sete vezes, para dar sorte.
Homens querem ter mulheres.
Mulheres querem ser
mulheres.
Homens precisam de
mulheres para terem mulheres.
Mulheres precisam de
homens para serem mulheres.
Gays são mais felizes
por amarem algo que compreendem.
Bezerros com focinhos
gelados querem grama gelada.
O papa trocou de
sapatos e agora é um deus.
Marilyn Monroe é o
papa com roupas diferentes.
Ser mulher até para
uma mulher é o labirinto de Creta.
Ser mulher é ser um deus.
Sem ser papa. Sem vestido branco sentada em um ventilador.
Feliz de quem come
grama gelada.
Sozinho comprando
pasto na feira.
Um livro marcado de
Vergílio Ferreira.
Blá blá blá. Disse o
diretor de teledramaturgia ao falar, novamente, sobre a guerra dos sexos.
A guerra não é contra
o sexo nem pelo sexo. É uma guerra santa, contra nós mesmos. Seria pecado parar
de lutar contra si?
Displicentes
autofalantes cantam flume isolando-me
em um universo de lataria gradeado pelas percepções dos vidros de areia e
mentira, meu corpo trafega na mesma vastidão que galgam os pensamentos:
condicionado ao fluxo de terceiros. Referir-se à humanidade como terceiros é o
prenúncio da renúncia do amor. Dessemelhança. Quer escolher alguém? Só o amor é
todo cor de vinho e cá estou, rodando através da pneumática para um destino
indiferente.
Chove.
Pelo mesmo vidro
assisto as pessoas correrem. Elas colocam objetos sobre as cabeças, olham
obstinadas para um metro à frente dos pés. Pássaros ouvem um
disparo.
Em uma paisagem azáfama
algo estático salta-me aos olhos em completa homogeneidade, abrupto e feroz,
sinto o desejo de referir-me a ela como uma primeira, assemelha, estanco a compassada
locomoção em prol das minhas fagulhas que acreditam em algo todo cor de vinho.
Ela tinha o cabelo
desprovido de cor, olhava para o céu escuro com olhos claros, banhada pela água
e à margem das lágrimas, olhos luzentes suprimidos pela atmosfera soturna de um
céu impresso sem tinta. Segurava uma maleta em frente ao peito,
como se esta pudesse proteger seu coração de algo.
Ela olhou minha face
e começou a chorar. Sentia uma dor tão extensa que não poderia despejar aquelas
lágrimas sem plateia. Talvez necessitasse ser vista para compreender que
tamanha dor sentida era real.Eu via a
tez pálida como envoltório de sua consistência desesperançada e mortuária, seu
espírito afogado através da incredulidade das corridas de terceiros pelas
calçadas molhadas enquanto ela, erma e estatelada, buscava algum alento no céu e
a maleta obsoleta era segurada com os resquícios do sonho a lamber os dedos: um emalado paraíso de anemia.
Contive o impulso de
sair do universo de lataria, trocar uma palavra errática com aquela santa que
não mendigava fé, beijar-lhe os doentios lábios verde-mar e acariciar seu
cabelo enxugando chuva embalsamada que umedece todo bicho que sofre sozinho.
Os terceiros no
universo de lataria começaram a se movimentar, eu os acompanhei, não meus
pensamentos.
Torci o pescoço e avancei
até não mais poder vê-la.
Minha alma permanecia pousada sobre o nó anelar, algo courinotocando uma alfazema, em conjunto àquela mulher que sofria úmida e
de corpo abraçado à maleta. O que haveria dentro desta?
Um buzinaço.
Um pneu gemendo
estridente.
Um carro capota à
minha frente.
Vidros de mentira
foram estilhaçados, corpos foram desmembrados e gritos de histeria contaminavam
ainda mais a chuva chumbo que caía. Muitos saíram de suas latarias e correram
no encalço da tragédia concebida, figurantes do dia a dia esperançosos pelo
momento de usar suas fantasias.
Nada fiz.
As verdadeiras
tragédias nunca são contempladas, tampouco remediadas.
Segue meu fluxo de
pensamento.
Segue meu destino
indiferente.
Segue a dor de alguém
que alaga a calçada.
Ciente.
Eu estava dentro
daquela maleta; exausto em me segurar, semoto para me abrir, absorto na
incredulidade que algo há para salvar.
Como a chuva, só
podemos cair. Um arrepio na medula e a vida, irão passar.
Joguei meus sapatos
para cima e eles incendiaram ao tocar a liberdade de um céu sem nuvens. Azul
sempre foi a cor do amor, sentimento aparafusado pela calmaria da água com a
destreza de um avô consertando um brinquedo querido.
Mas nem toda água é
azul. Eu sei disso por querer sentir como ontem.
Algum ontem.
Pés entremeados na
terra lamacenta, sujeira reciclável, dedos sujos rasgados por vidros limpos. É
necessário caminhar. Cheguei à margem do rio da minha vida. Contemplei-o da mesma
forma que havia feito outras vezes. – Vezes. Qualquer número multiplicado por
zero é igual a zero. Eu desenho o círculo perfeito. – Os mesmos tocos podres
sendo carregados pela água turva, a mesma ausência de peixes, deferência e
piano, o mesmo espelho lúgubre que delatava um monstro em tímido aproximar. Eu
espiava sabendo o que seria revelado. – Sou uma morte perfeita.
Olhei no outro lado
do rio e vi você.
Sua pele leitosa como
um exército de margaridas pós holocausto me deu nojo. Sorri como um lobo e lhe
disse que havia todas as respostas para suas perguntas ainda não formuladas no
leito do rio, permitindo que pequenos silvos por entre meus dentes afiados
escapassem elucidei que ter as respostas antes das perguntas era como colocar o
dedo antes de surgir a ferida. E todo toque é bom quando não há dor. Você
sorriu. Dois sextos do meu ser cogitou benquerer você, mas, não somos aquilo
que queremos ser.
Saltaste na água com
a força que eu desejava, projetei meu corpo logo em seguida.
Abri meus olhos e vi a
sujidade dançar em líquido palco turvo, braços e pernas sempre tão errantes
buscando algo, em nosso caso, profundo, pois somos feitos de lodo e não vamos
parar até tocar o fundo.
E no fundo estamos
amor.
Tudo é sujo e você é
branca.
Tudo é barro mas você
encanta.
Tuas vestes efêmeras
são como pétalas que com dois dedos se arranca. Te hipnotizo sem olhar, puxo
teu cabelo para trás, mastigo teu ombro no fundo do rio da sua vida.
E a cada segundo
respirar menos importa.
Se entregue amor, sei
como você gosta.
Abra sua boca e beba
dessa água turva enquanto dança em meus braços. Vire-se para gozar dentro da
minha íris, muito prazer, durante toda sua vida lhe esperei.
Sou sua morte sem
encontro marcado lhe forçando o prazer de um último viver.
E tudo a água irá levar.
Menos eu.
Saio do rio sem estar
molhado. Lá me aguardam novos calçados. É preciso caminhar e novamente assim o
faço.